A morte é um tema muito difícil de transmitir às crianças. Não só pelo receio do seu sofrimento mas também pela dor, que nós adultos, também sentimos com a perda. Se para nós é doloroso, colocamos uma conotação mais elevada no que a criança poderá sentir. De facto, temos conhecimento e estratégias que os mais pequenos ainda não possuem. As crianças fantasiam, idealizam e criam cenários, numa simbiose entre o real e o imaginário.
O mais comum é dizer que a pessoa amada foi para o céu. Em consulta, as crianças questionam-me:
- Patrícia, como é que a minha avó não cai do céu?;
- Como é que a minha prima consegue ver-nos se é uma estrela? As estrelas não têm olhos!;
- Patrícia, se o meu pai está no céu, e é cuidado por Deus, como é que Deus consegue cuidar de tanta gente ao mesmo tempo?;
- Estou muito preocupado Patrícia. Hoje está a chover. A minha irmã está no céu. Deve estar cheia de frio!.
São alguns exemplos que, a maneira "mais simpática da morte" também pode trazer angústias. As fantasias das crianças podem ser boas ou más.
Não concordo que sejamos totalmente transparentes em relação à morte. Como já referi, as crianças ainda não têm conhecimento científico para entender e ainda não têm estratégias emocionais para reestruturar como um adulto.
Vai haver sempre uma imaginação muito ativa na cabeça das crianças! Julgo que o essencial é transmitir que, apesar de a pessoa amada já não estar presente, estará sempre no seu coração. Que continua a desejar que a criança esteja alegre e que brinque. Que continua a gostar dela. Lembrar à criança das coisas boas que transmitiu, das brincadeiras que fizeram e dos carinhos que trocaram.
Tento sempre adequar o conceito de morte a cada criança, consoante a sua idade e a sua maturidade emocional. Preocupo-me em prevenir algumas angústias. Geralmente, pergunto aos miúdos se, quando estão a dormir profundamente, lembram-se de ter fome, frio, sede ou outra necessidade. Dizem que não. Então, tal como ele/a, a pessoa que morreu também não sente dor, fome ou frio. Está num sono profundo e descansado/a, feliz pelos abraços, pelas brincadeiras e pelas conversas que ambos tiveram. Geralmente, as crianças sorriem de alívio.
Mas continua a ser um tema difícil. A morte é difícil para todos. Infelizmente não conseguimos evitar que aconteçam situações de vida dolorosas. Podemos sim, é tornar a angústia mais leve.
- Este texto é dedicado à família da Maria, uma menina que foi uma estrela bem brilhante, alegre e valente na luta contra o cancro. Continua a ser uma estrela nos nossos corações como tantas outras crianças.
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